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segunda-feira, 30 de junho de 2014

Anders Zorn, o pintor realista sueco



Autorretrato
Anders Leonard Zorn é um pintor de origem sueca, nascido em 18 de fevereiro de 1860. 
Sua pintura a óleo e suas aquarelas são compostas de paisagens sobre a vida no campo, de retratos e nus, e também mostram sua forma especial de representar a água. Ele é, junto com Carl Larsson, o pintor mais popular da Suécia.

Anders Zorn passou sua infância numa fazenda perto da cidade de Mora. Sua família tinha uma vida simples no campo, e isto marcou sua vida e sua obra, como mostram as numerosas obras que descrevem a vida camponesa na Suécia. Ele também fez vários quadros de sua mãe e de sua avó, a quem era muito apegado. Seu pai, Leonhard Zorn, um cervejeiro alemão, conheceu sua mãe durante uma viagem dele à Uppsala. Ela engravidou, mas Anders Zorn jamais viu seu pai. Foi criado pela mãe e avós maternos.

Em 1872, quando seu pai morreu, ele herdou uma pensão em dinheiro que lhe permitiu ir estudar na Academia Real de Belas Artes de Estocolmo. Inicialmente ele aprendeu a técnica da escultura em madeira. Imediatamente ele se interessou pela aquarela e muito cedo ele se tornou um prodígio de aquarelista em meio aos que frequentavam a academia. A sua tela “De luto” foi selecionada, entre outras, para a apresentação anual da Academia.
De luto, Anders Zorn, aquarela, 1880

Insatisfeito com o conservadorismo da Academia de Belas Artes, Anders Zorn a abandona em 1885 e sai em viagem pela Espanha, Paris e Londres. Nesses lugares, ele realiza diversos retratos em aquarela, nas quais chama a atenção para seu domínio técnico.

Casa-se em 1885, na Suécia, com Emma Lamm e viajam juntos para Constantinopla e Alger. Ele sempre observa a água dos mares por onde passava. Depois eles retornam à Suécia, e Zorn constroi uma casa na cidade de Mora, onde nasceu. 

Em 1889, ele foi a Paris participar da Exposição Universal daquele ano, mesmo período em que o Impressionismo começa a ser reconhecido como uma grande forma de pintura. Sua obra passa a ser bastante apreciada na França, para onde ele volta regularmente. Em 1906 ele expõe em Paris 166 quadros, e teve uma grande aceitação por parte de críticos e do público.

Nos últimos anos de sua vida, ele se dedica novamente à escultura e à gravura. Anders Zorn faleceu em Estocolmo, no dia 22 de agosto de 1920.

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Algumas de suas pinturas:






Gravura de Anders Zorn




quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O grande Giovanni Boldini

Autorretrato, Giovani Boldin, óleo sobre tela, 1892
Assim como seu contemporâneo John Singer Sargent, (leia aqui), Giovanni Boldini é um pintor retratista de renome internacional, trabalhando principalmente em Paris e Londres. No início do século XX, é um dos retratistas mais proeminentes em Paris. Ele tem sido uma de minhas referências na pintura e por isso apresento aqui uma breve biografia deste grande pintor.

Giovanni Boldini nasceu em Ferrara, Itália, em 31 de dezembro de 1842. Foi o oitavo dos 13 filhos de Antonio Boldini e Benvenuta Caleffi. Seu pai era pintor acadêmico e restaurador. Diz-se que possuía grande domínio técnico e fez boas cópias de pinturas de Rafael e de outros pintores venezianos. Desde muito cedo, Giovanni recebeu de seu pai suas primeiras lições de desenho.

A partir de 1858, em sua cidade natal, tornou-se aluno do curso de pintura de Girolamo Domenichini (1813-1891) que, junto com Antonio Boldini foi o autor dos afrescos do Teatro Academico local. Boldini também teve a oportunidade de conhecer de perto a obra dos grandes pintores ferrarenses do período da arte italiana chamado de Quattrocento, como Dosso Dossi e Parmigianino.


Canal de Veneza com gôndola,
óleo sobre tela, 1899
Sua primeira obra importante foi “O quintal da casa paterna”, um óleo terminado em 1855. No final da década de 1850, Boldini já havia concluído um “Autorretrato com 16 anos” e retratos, como o de seu irmão “Francesco”, e de “Maria Angelini” e “Vittore Carletti”.

Em 1862, Giovanni Boldini se inscreveu na Academia de Belas Artes de Florença, tendo estudado com Stefano Ussi (1822 - 1901) e Enrico Pollastrini (1817 - 1876). Nesse período, junto com outros artistas florentinos, começou a frequentar o Café Michelangelo (onde também se reuniram os pintores do movimento Il Macchiaioli - leia mais aqui). Destes, conheceu Giovanni Fattori, Odoardo Borrani, Telemaco Signorini, Cristiano Banti, Montemurlo e Michele Gordigiani. Nesse período em Florença, Boldini será hóspede na casa da família Falconer. Numa casa de campo pertencente a esta família, ele pinta com têmpera a seco, entre 1867 e 1870, as paredes de uma pequena sala. A viúva de Boldini comprará esta casa em 1938; hoje ela abriga uma boa quantidade das obras do pintor.

Junto com Cristiano Bonti, Boldini vai a Nápoles em 1866. Fará vários retratos de seu amigo. No ano seguinte, junto com a família Falconer faz uma viagem à França e em Montercalo ele pinta o quadro intitulado “General espanhol”, que ele considera uma das melhores obras de sua juventude. Em Paris, acontecia a Exposição Universal e nosso pintor italiano conhece os franceses Edgard Degas (leia aqui), Alfredo Sisley e Édouard Manet.


Retrato de Marthe Bibesco,
Boldini, óleo sobre tela, 1911
 
Em 1870, convidado por William Cornwallis-West, que havia conhecido em Florença, passa uma temporada em Londres. O amigo lhe põe a disposição um estúdio no centro da cidade, frequentado pela alta sociedade. No final do ano, volta para Florença e, no ano seguinte, se muda para Paris. La conhece a modelo Berthe, com quem passa a morar. Um dos maiores marchands de Paris, Goupil, o contrata como pintor. Para ele já trabalhavam Mariano Fortuny (leia aqui) e Ernest Meissonier, além de dois outros italianos, Giuseppe Palizzi e Giuseppe De Nittis. Boldini pinta uma série de quadros.

Em 1874, expõe com muito êxito no Salão de Paris seu quadro “As lavadeiras”. Termina seu caso com Berthe e começa a se relacionar com a condessa Gabrielle de Rasty, de quem expõe um retrato no Salão de 1875. Em 1874 ainda, sua mãe morre e ele volta brevemente à Ferrara. Em 1876, faz uma viagem à Alemanha aonde conhece e faz um retrato do grande pintor alemão Adolph von Menzel (leia mais sobre ele aqui). Passando pela Holanda, viu de perto as obras de Frans Hals (mais aqui).


Nessa fase de sua vida, Boldini já era muito solicitado como pintor de retratos. Em 1886, faz um retrato do compositor italiano Giuseppe Verdi, em óleo sobre tela. Dará esse retrato pessoalmente a Verdi sete anos depois em Milão. Mas, ainda insatisfeito com o resultado, faz um segundo retrato de Verdi em pastel, em apenas 5 horas. Este segundo, guardou-o consigo e o apresentou na Exposição Universal de Paris em 1889 e em 1897 participou com ele da I Bienal de Veneza. Em 1918, doou este trabalho à Galeria de Arte Moderna de Roma.


Retrato de Giuseppe Verdi,
Boldini, pastel sobre papel, 1886
Resolveu aumentar o tamanho de suas telas, por sugestão do pintor sueco Anders Zorn, a quem tinha conhecido em 1890 (leia sobre Zorn aqui).

Na primavera de 1900 ficou hospedado na casa da família Florio, em Palermo, Itália, para pintar o retrato da senhora Donna Franca. Esta pintura não agradou a seu marido, por causa do amplo decote e das pernas descobertas um pouco abaixo dos joelhos. Boldini adaptou-o ao gosto do marido. Esse quadro foi vendido em 1928 pela enorme soma de um milhão de liras. Anos depois foi roubado pelos ocupantes nazistas em Paris e levado para a Alemanha, onde sofreu sérios danos. Restauradores foram obrigados a cortar a parte inferior do quadro, porque estava totalmente destruída.

Quando começou a I Guerra Mundial, ele se muda para Nice - na Riviera francesa - junto com sua modelo Lina. Permanece lá até 1918, retornando a Paris. Já enfermo e com a visão debilitada, casa-se com Emilia Cardona em 29 de outubro de 1929, mas morreu dois anos depois, no dia 11 de janeiro de 1931. Tinha 89 anos de idade. Seus restos mortais foram trasladados à Itália, onde descansam junto com os de sua família, no cemitério de Ferrara.


Retrato de Adolph von Menzel, Boldini, óleo sobre tela
Após o banho, Boldini, óleo sobre tela
Rosa no vaso, Boldini, óleo sobre tela
Portrait of the Countess de Martel de Janville, Boldini, óleo sobre tela, 1894
Madame Rejane e seu cão, Boldini, óleo sobre tela, 1885

Homem na igreja, Boldini, aquarela, 1900
Retrato de um jovem, Boldini, óleo sobre tela
Retrato do artista Ernest Ange Duez, Boldini, óleo sobre tela
Ilha de San Giorgio em Veneza, Boldini, óleo sobre tela, 1872
John Lewis Brown com esposa e filha, Boldini, óleo sobre tela, 1890
Atravessando a rua, Boldini, óleo sobre tela, 1873-75

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Os Itinerantes

Tempo de colheita, Grigoriy Myasoyedov, óleo sobre tela, 1887
Em 1863, um grupo de quatorze alunos decidiu deixar a Academia Imperial de Belas-Artes de São Petersburgo. Eles consideravam as regras da Academia restritivas e os professores conservadores. Também não concordavam com a separação rigorosa entre alunos com mais talento e os com menos, nem com a competição que era muito incentivada pela direção e professores. Eles defendiam que a arte deveria ser levada ao povo e deveria refletir a sociedade russa e não os padrões acadêmicos de então.

Retrato de Fyodor Dostoyevsky,
Vasily Perov, óleo sobre tela, 1872
Esses princípios da Academia ainda se regiam pelas convenções do academismo neoclássico, em grande parte inspirado pela arte italiana, assim como pela academia francesa. Para a Academia de São Petersburgo, além disso, a "grande pintura" era a histórica, gênero mais prestigiado, com temas geralmente retirados da Bíblia, da mitologia greco-romana e dos grandes eventos da história antiga. Somente se mantendo dentro destes limites é que os alunos podiam concorrer à medalha de ouro na competição anual, que dava direito a uma bolsa de estudos no exterior. Outros temas, como a paisagem e natureza-morta eram considerados menores e impróprios para o artista educado lá.

Por exemplo, dois artistas - Mikhail Shibanov e Nikolai Argunov - já haviam tentado pintar outras temáticas, como cenas com camponeses e as vilas do interior, mas encontraram a oposição de professores e da direção da Academia. Em 1840 outro artista, Pavel Fedotov, realizou estudos satíricos sobre a vida burguesa, obtendo mais sucesso que seus colegas e obrigando a Academia a fazer algumas concessões. Algumas obras nesse gênero foram premiadas, o que incentivou outros alunos a se dedicar a uma pintura do cotidiano, mas com avanços mínimos.

Mas em 1861, Vladimir Stasov levantou sua voz em defesa de mais liberdade na Academia. Ele era um influente crítico de arte e não apenas apoiou as inovações que começaram a surgir como criticou diretamente o conservadorismo dos acadêmicos. Também passou a defender que a pintura se voltasse para a realidade nacional e para temas populares.

Pintura de Ivan Kramskoi
Em 1863, veio a gota d’água que faltava para o rompimento definitivo com a Academia. Treze artistas foram selecionados para concorrer à medalha de ouro, conforme as regras do concurso. Anualmente, os jurados sempre determinavam qual seria o tema sobre o qual os artistas deveriam trabalhar. Naquele ano, diferentemente dos anteriores, os jurados resolveram deixar flexível a escolha do tema por parte dos estudantes, mas que levassem em conta seus próprios sentimentos. Vendo que os jurados alargavam seus critérios, os treze artistas solicitaram que fosse dada liberdade completa de escolha do tema. Pedido rejeitado, os jurados resolveram reagir de forma contrária e voltaram às regras antigas do concurso, com tema único, como sempre acontecera. O assunto escolhido foi: "A festa de Odin no Valhala". Revoltados, os pintores, liderados por Ivan Kramskoi, abandonaram a competição e a Academia, formando a Associação dos Artistas Livres.

Mas eles não estavam apenas se insubordinando. Sua rebeldia era também reflexo de suas convicções de que o artista deveria poder escolher seus assuntos de acordo com suas preferências e sua visão de mundo, sem ter de prestar contas disso a instâncias superiores.

Em 1870, esta organização - já ampliada com a presença de outros artistas - foi denominada “Sociedade de Exposições Itinerantes de Obras de Artistas Russos” (Peredvizhniki) - ou simplesmente “Os Itinerantes”. Eles queriam dar às pessoas das províncias a chance de seguir de perto as conquistas da arte russa e ensinar as pessoas a apreciar a arte. A sociedade manteve-se independente de apoio oficial, mas recebeu incentivos da parte de industriais, como Pavel Tretyakov, um grande colecionador de obras de arte, que incentivou exposições dos trabalhos desses artistas e deu-lhes importante suporte material.

Os objetivos do grupo eram: educar o povo possibilitando que entrasse em contato com a nova arte russa, formar um novo gosto e conceito de arte, e formar um novo mercado para essa arte nova.

É bom lembrar que, em Paris, Gustave Courbet se revoltou contra a Academia Francesa e inaugurou sua exposição individual intitulada "Realismo"; que Anders Zorn, pintor realista sueco, já causava admiração por onde passava; que Mariano Fortuny, na Espanha, já implementava os conceitos realistas em sua pintura; que Giovanni Boldini, na Itália, se juntara aos Macchiaioli e era um dos líderes deste grupo; que Adolph Menzel também rompera com as regras da academia alemã e se voltava ao realismo; que John Singer Sargent, um dos maiores gênios realistas do século XIX, já encantava e intrigava a todos com sua grande qualidade técnica... Que o Realismo abria espaços amplos para as vanguardas europeias do século XX... E que exercia grande influência sobre os artistas russos, em especial Courbet, Zorn e Fortuny...

As lavadeiras, Abram Archipow,
óleo sobre tela,1901
A primeira exposição pública de "Os Itinerantes" aconteceu em 1871 na própria Academia, com grande repercussão. Foi bem recebida até mesmo por críticos contrários, como Mikhail Saltykov-Shchedrin, sensibilizado com a ideia de que esta mostra deveria não só ser apresentada em São Petersburgo e Moscou mas também deveria percorrer outras cidades do interior. Foi a primeira vez que uma exposição de arte pode ser vista por um público mais amplo, pois até então a maioria das pessoas somente conheciam as novidades da pintura vendo reproduções em jornais, catálogos e gravuras. Esta exposição também foi um sucesso comercial; a própria família imperial adquiriu muitas obras. O colecionador Pavel Tretyakov, que já apoiava o grupo, adquiriu muitas obras.

“Os Itinerantes” foram influenciados pelas ideias de intelectuais como Vissarion Belinsky e Nikolai Chernyshevsky, críticos literários que defendiam idéias liberais. Belinsky dizia que a literatura e a arte deveriam ter responsabilidade social e moral. Como a maioria dos eslavófilos - movimento que defendia a tradição e a cultura russa - Chernyshevsky apoiou ardentemente a emancipação dos servos realizada em 1861. Na época, haviam 20 milhões de pessoas vivendo como servos. Para ele, a servidão, a censura da imprensa e a pena de morte eram influências ocidentais. Ele mesmo tinha sido censurado em seus escritos, por causa de seu ativismo político. Chernyshevsky era considerado um socialista utópico. Escreveu bastante sobre o papel da arte, o que influenciou os artistas Itinerantes.

“Os Itinerantes” retrataram aspectos multifacetados da vida social, muitas vezes criticando as injustiças. Pintavam  não apenas os temas da pobreza, mas também a beleza do estilo de vida do povo; não só seu sofrimento, mas também a força de seus personagens. “Os Itinerantes” condenavam o poder aristocrático e o governo autocrático em sua arte humanista. Retrataram os movimentos de emancipação, a vida social-urbana e, mais tarde, usaram a arte histórica para retratar as pessoas comuns. Tiveram seu apogeu entre 1870 e 1880.

Em seu período de formação (1870-1890), “Os Itinerantes” desenvolveram um ponto de vista amplo para suas pinturas, com imagens realistas, mais naturais. Em contraste com a paleta escura tradicional de seus tempos de estudante da Academia, escolheram uma paleta mais leve, com uma maneira mais livre em sua técnica. “Os Itinerantes” eram a sociedade que unia os artistas mais talentosos do país, que incluía artistas da Ucrânia, Letônia e Armênia.

Numa rua de Moscou, Vasily Polenov,
óleo sobre tela, 1878
Entre os temas de “Os Itinerantes”, estava a pintura de paisagem, que floresceu nos anos 1870 e 1880. “Os Itinerantes” pintavam paisagens próximas; alguns entre eles, como Polenov, usava a técnica de plein-air (pintura ao ar livre). Dois pintores, Ivan Shishkin e Isaak Levitan, pintaram apenas paisagens da Rússia. Shishkin - outro paisagista - é considerado o "cantor da floresta" russa, mas as paisagens de Isaac Levitan são mais famosas e expressam seus intensos sentimentos de artista. Os pintores paisagistas russos desejavam explorar a beleza de seu próprio país e incentivar as pessoas comuns a amar e a preservar seus lugares. Levitan disse uma vez: "Só imagino tal graça em nossa terra russa, esses rios transbordantes que trazem tudo de volta à vida. Não há um país mais bonito do que a Rússia! Só pode haver paisagistas na Rússia". “Os Itinerantes” deram este caráter nacional para as paisagens, inclusive permitindo que pessoas de outras nações pudessem conhecer como era a paisagem russa. Estas paisagens são a concretização simbólica da nacionalidade russa. Após “Os Itinerantes”, a paisagem russa ganhou importância como uma espécie de ícone nacional.

Ao longo dos anos, a quantidade de pessoas que viam as exposições de “Os Itinerantes” cresceu muito na população do interior da Rússia. Mas não só, pois elas atraíram também a atenção dos mais acostumados a frequentar exposições, assim como da elite urbana. Fotógrafos criaram as primeiras reproduções das pinturas de “Os Itinerantes”, ajudando a popularizar as obras, que poderiam ser compradas. Revistas, como a Niva, também publicavam artigos ilustrados sobre as exposições.

A origem de seus membros era variada; alguns eram camponeses, outros da burguesia urbana, e havia até nobres, mas todos se moviam com o objetivo comum de mostrar a vida em seu país. Associavam assim um estilo basicamente realista, de qual foram os principais divulgadores, com uma base ideológica de fortes traços românticos, idealistas e nacionalistas.

Velho camponês, Vasily Perov,
óleo sobre tela, 1870
Encaravam seu trabalho como uma missão sagrada. Vladimir Stasov, um dos mais ardentes incentivadores do grupo, disse que "os artistas que desejavam se unir para reformar sua sociedade não o estavam fazendo com o propósito de criar belas pinturas e estátuas com a finalidade única de ganhar dinheiro. Estavam tentando criar um alimento para as mentes e os sentimentos do povo".

Com o sucesso do grupo, que em pouco tempo aglutinou a maioria dos melhores talentos da pintura russa de sua época, a academia já não podia mais ignorá-los, e não só sua influência estética se fez sentir no meio acadêmico, mas também diversos deles foram contratados como professores, como Ilya Repin.

Muitos deles haviam ingressado no grupo porque acreditavam que a arte precisava alcançar um público mais vasto, e que deveria servir como uma força para o avanço social e o combate às injustiças e preconceitos. Mas quando seus ideais foram abraçados pela academia, começou a perder a vitalidade contestadora dos primeiros anos e as pesquisas mais arrojadas começaram a ser banidas pelo próprio grupo, que fora, em sua origem, uma vanguarda rejeitada pela oficialidade. O ciclo se repetia. Então diversos membros deixaram o grupo para prosseguir de forma individual, com mais liberdade. Com o passar dos anos, a arte dos Itinerantes já não espelhava os novos tempos e as mudanças na sociedade, e seu realismo de cunho social foi suplantado pelo decorativismo art nouveau do grupo Mundo da Arte e pelas vanguardas abstratas do modernismo.

Mesmo assim sua proposta original voltou a ser prestigiada quando o governo revolucionário assumiu o poder e estabeleceu as diretrizes para a formação do Realismo Socialista, do qual os Itinerantes foram um precursor, e onde diversos de seus representantes encontraram espaço para continuar em atividade. O Realismo Socialista resgatou as ideias iniciais de “Os Itinerantes”, quando estes artistas estavam convencidos de seu papel social como artistas em um país onde tudo estava em processo de transformação. Da arte à política.

“Os Itinerantes”, ao longo dos anos, produziram mais de 3.500 pinturas que foram vistas por mais de um milhão de pessoas em um grande número de cidades. O grupo durou até 1923, quando muitos de seus membros passaram a integrar a Associação de Artistas da Rússia Revolucionária (AKhRR, sigla em russo).

Abaixo, algumas das obras representativas de "Os Itinerantes":

Os rebocadores do Volga, Ilya Repin, óleo sobre tela, 1870-73

Procissão religiosa na província de Kursk, Ilya Repin, óleo sobre tela, 1880–83

Resposta dos cossacos de Zaporozhian, Ilya Repin, óleo sobre tela, 1880-91
Vigília, Arkhip Kuindzhi, óleo sobre tela, 1905-1908
Sessão do Tsar Michael I com a Duma Boyarda, Andrei Ryabushkin, óleo sobre tela, 1893
Procissão de Páscoa, Illarion Pryanishnikov, óleo sobre tela, 1893
Campo de centeio, Ivan Shishkin, óleo sobre tela, 1878
Chuva na floresta, Ivan Shishkin, 1891
Sonhos, Vasily Polenov, óleo sobre tela, 1895
Retrato de Isaac Levitan, Valentin Serov, óleo sobre tela, 1893
Ponte na floresta, Rafail Levitsky, óleo sobre tela, 1895-96
Pobres recolhendo carvão, Nikolay Kasatkin, óleo sobre tela, 1894
Retrato de Vladimir Solovyov, Nikolai Yaroshenko, óleo sobre tela, 1892
Os cegos, Nikolai Yaroshenko, óleo sobre tela, 1879
Consertando a estrada, Konstantin Savitsky, óleo sobre tela, 1874
Cristo no deserto, Ivan Kramskoi, óleo sobre tela, 1872
Retrato de uma desconhecida, Ivan Kramskoi, óleo sobre tela, 1883

domingo, 24 de março de 2013

Michael e Anna Ancher

Fotos do casal Anna e Michael Ancher (Museu Skagen)
Michael Peter Ancher foi um pintor dinamarquês. Ele é muito conhecido pelas suas pinturas de pescadores e outras cenas do porto dinamarquês da cidade de Skagen, uma pequena vila de pescadores localizada numa ponta de terra ao norte da Dinamarca, bem na convergência entre o Mar do Norte e o Báltico. Terras e mares muito gelados do norte europeu. Ele é um dos artistas mais populares em seu país, apesar de pouco conhecido, pelo menos aqui no Brasil.


Michael Ancher:
Retrato inacabado de Adrian Stokes
Michael Ancher nasceu no dia 9 de junho de 1849, em Rutsker, na ilha de Bornholm, que pertence ao reino da Dinamarca. Aos 16 anos ele trabalhava como caixeiro aprendiz e em suas horas livres desenhava e pintava. Por causa do seu talento, ele foi admitido na Academia Real Dinamarquesa de Arte em Copenhagen, onde estudou entre 1871-1875. Lá foi incentivado por seus mestres a se dedicar à pintura de gênero (um tipo de pintura de cenas da vida cotidiana, do mundo do trabalho e dos espaços domésticos). 

Um seu colega de curso, Karl Madsen, o convidou para ir conhecer a vila de Skagen. Nesta pequena vila, um grupo de pintores se reuniram numa associação que eles chamavam de Pintores de Skagen. Michael resolveu se mudar para lá e se junto ao grupo de pintores, cujo ponto de encontro acontecia no Hotel Brondums, onde eles conversavam, discutiam suas ideias, mostravam seus trabalhos. Lá, Michael conheceu Anna Brondum, a filha do dono do hotel, com que se casou. Anna também era pintora.


Michael Ancher: O Afogado, 1891
Em 1879, Michael Ancher começa oficialmente sua carreira de pintor com o quadro “Será que ele vai sobreviver ao gelo?”, que representa um grupo de pescadores na praia, olhando para algum ponto no mar, preocupados com algum companheiro que ainda está no mar. Michael Ancher foi um pintor realista e as composições de suas obras são impressionantes. A Academia Real Dinamarquesa de Belas Artes dava bastante ênfase ao estudo da composição. Três outros de seus quadros de pescadores bastante conhecidos foram pintados entre 1883 e 1896: “Bote salva-vidas”, “Tripulação a salvo” e “O afogado”. 


Michael Ancher: "Será que ele vai sobreviver ao gelo?"
Ancher teve uma formação acadêmica, como era muito comum naquela época, inclusive aqui no Brasil, mas o casamento com Anna, uma pintora realista, fez com que sua arte fosse na direção da pintura figurativa mais moderna, a arte realista, que na França teve como grandes nomes Gustave Courbet e Camille Corot, de algumas décadas antes. Michael Ancher pintou uma obra figurativa moderna monumental, “O Batismo”. Um dos pintores mais admirados e preferidos por Michael Ancher era o holandez Rembrandt van Rijn.

Anna e Michael moravam numa casa que era ao mesmo tempo seu estúdio, onde trabalhavam. Sua residência definitiva foi comprada em 1884 e em 1913 um grande ateliê foi construído junto à casa. Helga, sua filha, havia nascido em 1883. Quando ela faleceu, em 1964, a casa e o ateliê, com todos os objetos da família, foram transformados numa Fundação. Depois tudo foi reformado e restaurado e em 1967 foi inaugurado o Museu Fundação Helga Ancher. O mobiliário é todo original e as pinturas de Anna e Michael preenchem as paredes do prédio, assim como as de diversos outros pintores de Skagen que participavam de seu círculo de amigos.

Michael Ancher morreu no dia 19 de Setembro 1927.


Michael Ancher: Pescadores
Anna Ancher


Michael Ancher: Anna
retornando do campo
Anna Kirstine Brøndum Ancher, nasceu em Skagen no dia 18 de agosto de 1859, onde viveu toda a sua vida até 1937.

Ela era filha de Ane e Erik Brondum, que eram donos de um hotel e uma mercearia. Ela ainda era criança, quando pintores começaram a chegar em Skagen. Eles vinham se reunir no hotel de seu pai e ela observava seus trabalhos e conversas com muito interesse. Começou a desenhar e pintar.

Em 1878 ficou noiva de Michael Ancher, com quem se casou em 1880. O casal viveu em Skagen todo o resto de suas vidas.

Anna Brondum Ancher desenvolveu sua carreira artística em um tempo em que era raro uma mulher se dedicar a isso. Assim como aconteceu com Camille Claudel, de quem falamos no post anterior. Por causa de ser mulher, Anna não teve acesso a nenhum estudo de aperfeiçoamento na Academia. Mas chegou a ter aulas de pintura em Paris no ateliê de Pierre Puvis de Chavannes, e depois em Copenhagen no ateliê de Wlliam Kyhn, que criou um curso só para mulheres. Ela estudou lá de 1875 a 1878 e seu professor - com a visão machista da época - assim que soube da gravidez de Anna recomendou que ela guardasse sua maleta de tintas e se dedicasse às tarefas domésticas...


Anna Ancher: Sol na sala azul
Mas Anna não o obedeceu e teve o apoio do marido. Ela já tinha participado de uma exposição em 1880 em Copenhagen e foi bastante admirada, sendo em seguida bastante reconhecida como pintora. Anna Ancher retratou a vida doméstica, os interiores das casas, mulheres e crianças. Suas telas são plenas de cor e luz, objetos maiores de seu interesse como pintora. Por isso, sua pintura tem muita semelhança com as pinturas impressionistas francesas, especialmente.

O seu quadro “Luz na sala azul” mostra também a sua pequena filha Helga sentada na sala azul do Hotel Brondums onde sua avó, Ane, muitas vezes gostava de se sentar. Anna pintou vários quadros com esta cena de sua mãe sentada nessa sala. Como se vê, o jogo de luz projetada na parede azul torna o quadro muito luminoso. A luz do sol na parede traz o mundo exterior para dentro da casa. Sua mãe, Ane, era muito religiosa e conservadora, mas mesmo assim apoiou os projetos artísticos da filha, concordando inclusive que ela fizesse um curso particular de pintura em Copenhagen.


Anna Ancher: Interior
Anna concentrou seus temas em cenas cotidianas, pintando pessoas ocupadas em seus afazeres domésticos, interiores, retratos de família, amigos e conhecidos. Em especial retratos de sua mãe. Mas pintou também pessoas pensativas, com o olhar distante, mas sempre telas luminosas, coloridas. Suas pinceladas são soltas, pictóricas.

O quadro “O luto” é o único de sua obra que não representa uma cena real. O quadro foi inspirado em um sonho que ela teve: ela está nua, de luto ao lado de uma cruz, no cemitério, e sua mãe a seu lado, já bem idosa. Poderia representar as diferenças entre mãe e filha. Sua mãe era muito religiosa, mas Anna, incluenciada pelas ideias revolucionárias de seus amigos artistas radicais e ateus, se via dividida entre esses dois mundos. No quadro essa divisão pode ser interpretada na mulher jovem e nua ao lado de uma mulher idosa e vestida.

Anna morreu no dia 15 de abril de 1935, em sua cidade natal.
Anna Ancher: Ane na sala azul

Joaquin Sorolla e os pintores escandinavos

Joaquim Sorolla é um pintor espanhol, cujo Museu Sorolla estarei visitando neste próximo mês de abril em Madrid e sobre o qual falarei bastante.

Mas fiz uma interessante descoberta enquanto estudava Anna e Michael Ancher: Sorolla foi influenciado pela pintura nórdica em suas obras.
Em 1889, a cidade de Paris celebra a Tomada da Bastilha com uma Exposição Universal. Foi o ano da inauguração da grande obra arquitetônica que até hoje é o maior ícone de Paris: a Torre Eiffel, concebida pelo engenheiro Gustave Eiffel. Mas nesse mesmo ano, um grupo de jovens pintores escandinavos expunha suas obras também na Exposição Universal, chamando a atenção de outros artistas e críticos, por causa da qualidade de seus trabalhos.

Claro que a França era o ponto de atração de artistas e estudantes de arte de todo o mundo naquela época e para lá também tinham ido muitos artistas e estudantes do Norte.


Joaquin Sorolla: Caminhando na praia, 1909
Sendo assim, esses pintores escandinavos que trouxeram suas telas em 1889 já haviam sido influenciados pela corrente francesa de pintura, em especial a chamada Escola de Babizon, com a pintura em plain-air e o realismo de Léon Bonnard, por exemplo. Quando estes pintores voltaram da França para a seus países, resolveram formar pequenos círculos fora dos centros urbanos maiores, como o fizerm o astistas franceses da Escola de Barbizon. E isso aconteceu na Noruega, Finlândia, Suécia e Dinamarca, terra de Michael Ancher.

Nessa exposição de Paris os maiores destaques foram: os dinamarqueses Michael Ancher, Viggo Johanssen e Peder Severin Krøyer; o norueguês Frits Thaulow; o sueco Anders Zorn e o finlandês Albert Edelfelt. Joaquin Sorolla ficou muito impressionado com a pintura destes artistas.

Sorolla estava passando férias em Assis, na Itália, acompanhado de sua mulher, Clotilde Garcia del castillo, com quem se casou um ano antes. Em seu retorno à Espanha, resolveram passar por Paris e foram visitar a Exposição Universal de 1889. Lá Joaquin Sorolla conheceu a nova pintura escandinava quando ele tinha ainda 26 anos e ainda estava se formando como artista. Sorolla, que já tinha muito interesse na arte realista, voltou para a Espanha bastante influenciado pela pintura desses artistas escandinavos. Podemos ver na obra de Sorolla o mesmo vigor dos pinceis, o colorido, os temas, a personalidade artística que se criou.

Mas falaremos de Joaquim Sorolla em breve, após minha visita a seu museu em Madrid.

Por enquanto, a minha felicidade está em ter descoberto a pintura do casal Michael e Anna Ancher.
Anna Ancher: Mulher de pescado costurando, 1890